Uma noite memorável

Eduardo Vieira
3 min readAug 8, 2022

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(Eduardo Vieira — 07/ago/22)

O terceiro sinal toca no teatro em São Paulo. Numa terra estranha para mim mas com tantos amigos queridos eu faço o sinal da cruz e peço a Deus que e permita ser um eficiente instrumento de Sua vontade. A minha deixa surge e entro no palco, cego pelas luzes dos refletores, sentindo mais que vendo a presença ansiosa da platéia.

- “Bem-vindos à Grande Jornada do Homem”, entôo antes de remover minha cartola e fazer uma humilde reverência.

Ao meu lado, antes sozinho no palco, um singelo copo d’água sobre um banquinho, símbolo escolhido dos confortos que hoje tomamos como garantidos e quase divinos. Mas que são tão voláteis e frágeis como um pequeno floco de neve flutuando devagar na brisa gelada do Norte.

Aquele copo e eu encaramos a dura missão de contar a história do Ocidente com alegria, citações divertidas, demonstrações práticas e muita história. Revivemos a audácia corajosa de Guilherme Tell na criação da Suíça, pilotamos um Spitfire em defesa da liberdade contra a máquina hedionda dos nazistas. Exortamos nossos soldados para mais um ataque à fortificação inimiga, contendo as lágrimas num emocionante discurso de combate.

Vencemos Stálin, Hitler e outros demônios com a força da Verdade, defendida por Sócrates com sua própria vida. Entoamos um belíssimo Aleluia pela preservação do meu maxilar ao demonstrar com alguma pequena dose de coragem a regra imutável da conservação de energia.

Vislubramos a extraordinária conquista de Marte no vôo de um pequeno foguete. Fui brindado com a contagiante gargalhada de uma figurinha abençoada que arrastou toda a platéia numa explosão de alegria.

No susto e no grito, fizemos bonito.

A generosidade daquele público tão querido foi algo realmente emocionante. Digo aqui, sinceramente, que não sou merecedor de tamanho prestígio. Mas o melhor estava por vir…

Pois a noite era enorme, como costumam ser aquelas memoráveis. Estas também reservam seus altos e baixos pois assim é a realidade.

Depois do espetáculo, tão divertido para mim quanto, espero, foi para o espectador, tive a emocionante alegria e surpresa de rever dois primos queridos no coquetel que se seguiu e dois amados colegas de universidade, onde sangramos juntos na tentativa de aprovação em Cálculo I. E tantos outros amigos que me encheram o coração de orgulho. Uma festa simples mas repleta de carinho que me trouxe muita alegria. Mas o melhor estava por vir…

Depois de tudo isso, ainda havia naquela noite algo mais. O lançamento em SP do livro com o qual tive a honra de contribuir com alguns simples textos. Com uma agilidade impressionante meu querido Dennys Andrade me transformou de palpiteiro de internet em escritor. Trata-se de um presente que jamais poderei retribuir. Mas o melhor estava por vir…

Deus dá com abundância mas é Dele também a realidade. E pelo celular eu recebi naquela noite das noites um tremendo golpe que me fez perder a respiração de dor e tristeza. A ingratidão é feia mas não era uma noite onde a feiúra tivesse espaço. Pelo contrário, naquela livraria eu fui alvo mais uma vez de imerecida atenção e carinho. Fiz várias dedicatórias para amigos e até então desconhecidos. Ouvi surpreendentes elogios e recebi inesperados abraços e votos de sucesso.

Mas o melhor estava por vir…

Em dado momento, atordoado por tantas demandas e tão fortes emoções, após carregar sozinho todo um espetáculo teatral num mini-furgão, após contrair dívidas fatais na esperança de realizar um trabalho que pudesse se sustentar, após amargar dias de dura angústia na incerteza de estar fazendo o trabalho desejado por Deus, após contemplar o desespero da existência de frente sem saber quem venceria a contenda, tudo se fez claro, belo e verdadeiro.

Uma pequena mãozinha apertou a minha. Outros dois bracinhos me abraçaram, sem saber o quão bem me fariam. E então, naquele momento tão especial, eu ouvi a voz de Deus naquela aguda vozinha de criança:

- “Eu gosto muito de você.”

E tudo ficou bem. Nada seria capaz de suplantar tamanha beleza, nem a mais amarga das maldades, nem a maior das feiúras. A face belíssima de Deus me sorria ali naqueles doces sorrisos que me olhavam, divertidos e carinhosos.

Peço a Deus apenas que me conceda a força para aguentar o tranco e ser-Lhe útil, nada mais.

Muito obrigado.

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Eduardo Vieira
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