Você quer a liberdade?

Eduardo Vieira
4 min readJun 27, 2020

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(Eduardo Vieira — 26/jun/2020)

Santos Dumont sobrevoando Paris

Adianto logo a minha resposta. Eu quero. Todavia a coisa não é simples como pode parecer. Andar na direção da liberdade acarreta em um custo. O bom é que esse custo é extremamente benéfico e educativo, ainda que algo trabalhoso numa primeira análise.

Liberdade é não precisar de amarras oriundas de entidades burocráticas para realizar suas funções. Esse é o ponto principal da falta da liberdade no Brasil. Vou explicar.

Em 1906 Alberto Santos Dumont realizou o primeiro vôo de um avião, no campo de Bagatelle, nos arredores de Paris. Naquela época a perspectiva de voar já estava na mente dos homens, meio reticentes sobre o assunto desde o desastre de Ícaro.

O fomentador desse estado de coisas foi ele mesmo, Santos Dumont. Poucos sabem que além de ter sido o pioneiro na aviação ele também foi o pioneiro no vôo controlado de balão. Sabem os tremendos dirigíveis alemães que encantaram o mundo? Todos beberam na fonte desse brasileiro genial. Aliás o próprio balão de ar quente foi inventado por outro brasileiro e demonstrado pela primeira vez na corte de Lisboa mas isso é outra história.

Santos Dumont voava por Paris em seus artefatos como os cavalheiros andavam de carruagem. É difícil imaginar o impacto disso, especialmente com o esforço esquerdista de matança dos nossos heróis. Santos Dumont era simplesmente uma das pessoas mais famosas e prestigiadas do planeta.

Em não raras ocasiões ele atendia a banquetes refinados em seus balões, para deleite de todos. Então os nobres cavalheiros esqueciam do rigor e da etiqueta e voltavam a ser crianças, correndo atrás da corda-guia do aparato, para frear o dirigível e trazê-lo para terra. De sua cesta saltava o pequeno e moreno brasileiro, com seu chapéu na cabeça, e punha-se a contar os detalhes de seus novos projetos para uma platéia embevecida.

Sabe Tony Stark? Sim, só que de verdade.

Imaginem vocês se hoje pode-se sequer sonhar em fazer isso? Voar de um lado para o outro sem milhares de certificações concedidas pelo Estado? Seria o caos, dizem todos. Entendo…

De volta para 1906, surgiu na esteira de Dumont uma miríade de aventureiros do ar. Alguns dedicados a romper barreiras e desenvolver técnicas de construção e pilotagem. Outros dedicados à profissionalização da atividade.

Não sei de onde surgiu a idéia de estabelecer limites e controles mas tenho certeza de que foi derivada do medo. Dessa raiz destruidora cresceu uma grande árvore de normas e exigências que transformou a pulverizadíssima indústria aeronáutica numa empreitada restrita a gigantes.

“Ah…” — me dirão. “Mas o que você queria? Aviões voando sem controle, caindo por todo lado? Seria uma carnificina.” Quem não vê a exata similaridade desse argumento com a falácia desarmamentista tem que dar um sacolejo na cabeça.

Posso pular da aeronáutica para qualquer setor, sem exceção. Em todos eles existe uma estrutura burocrática de cerceamento e entrave burocrático. E duvido que consiga achar meia dúzia de “defensores da liberdade” que estejam dispostos a advogar pela remoção desses entraves em suas categorias.

Trata-se de uma gigantesca rede de proteção sindical que atira contra o próprio pé. Os beneficiados são os venais, os improdutivos, os apadrinhados.

Tente abrir um banco aqui no Brasil para ver. Até nos EUA hoje as regras são gigantescas. E temos aqui cinco bancos se enchendo de dinheiro num mercado fechado à entrada de novos players.

Mas o que se ganha com redução de imposições e até onde isso deve ir? Bem, isso é uma questão de estrutura de valores. Para mim são poucos os limites. Não é compreensível que seja necessária a contratação de um contador para que se tenha uma empresinha pequena. As MEIs vieram há poucos anos e tem mais restrições que a Boeing. Não é o diploma de engenharia que garantirá a qualidade de um engenheiro. Quanto aos professores, chega a ser ridículo. O diploma de Pedagogia é quase uma garantia de incompetência, respeitadas as exceções.

Toda essa mentalidade está estruturada na terceirização do bom senso. Como desculpa, claro. O cerne está no protecionismo. Claro que qualquer pessoa que contrate um bombeiro para consertar seu banheiro vai perguntar aos amigos e estes só indicarão alguém de confiança.

Os bandidos que quebrassem seu banheiro e roubassem a louça seriam processados e a Justiça trataria do caso. A Associação Brasileira de Bombeiros e Encanadores não ajudaria em nada.

A mentalidade de liberdade está muito diluída em todo o mundo mas isso é mais grave aqui no Brasil, onde a mentalidade marxista se imiscuiu no senso comum até de muitos liberais.

Essa é a tragédia econômica brasileira.

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